No mês de outubro muito se falou a respeito do bullying em escolas e infelizmente os discursos a respeito foram motivados pela tragédia que ocorreu em Goiânia. É sempre uma constatação infeliz esperar uma situação trágica acontecer para discutir um tema tão relevante e que afeta a vida de muitas crianças e jovens, todavia é igualmente importante não desperdiçar qualquer oportunidade de levantar questionamentos e tentar construir aprofundamentos quando as pessoas parecem estar mais sensibilizadas e disponíveis a pensar sobre.

Minha proposta aqui não é trazer novas argumentações que possam corroborar com as inúmeras manifestações que exaltam a gravidade do problema e que pedem para a sociedade se mobilizar para não ignorar o bullying, se engajando enfaticamente na construção de novos modos de conviver. Sigo inteiramente solidária a esta intencionalidade, porém gostaria de aproveitar deste espaço para levantar algumas problemáticas que também atravessam este tema.

Quando falamos em educação estamos implicando a sociedade como um todo, mas, sobretudo as instituições família e escola, assim como estas se relacionam. Você que é responsável por uma criança ou adolescente, saberia me dizer se na escola em que este estuda há um profissional de psicologia integrando a equipe? Se há, você sabe qual a função deste profissional e como ele se relaciona com a vivência escolar? Se não há, já pensou que seria interessante cobrar da escola que ela se mobilizasse para ter um profissional de psicologia participando ativamente deste espaço?

Não é que o psicólogo seja a salvação para todos os problemas que existam no espaço da escola. Todavia, este é o profissional qualificado, indicado e responsável por oferecer escuta e intervenção diferenciada, cujo compromisso primordial é de somar na equipe escolar para oferecer atenção às singularidades imersas nas diferentes situações e dificuldades que possam emergir neste cenário; frente a questões como bullying, por exemplo, além de tantas outras delicadas e/ou tabus.

Precisamos compreender que a escola é uma instituição de aprendizagem que tem por objetivo favorecer acesso, partilhar e ensinar sobre os conhecimentos desenvolvidos pela humanidade, mas simultaneamente é o local onde crianças e jovens passam boa parte de sua rotina se havendo com valores, interagindo com outras pessoas e se formando eticamente. Quando falamos sobre ética estamos direcionando nossa atenção para pensar a respeito de como convivemos, como queremos conviver, quais valores irão nortear nosso olhar sobre o outro, sobre como estruturaremos nossa vivência em sociedade e, portanto, estamos falando de atos políticos.

Cabe aqui ressaltar que ter a oportunidade de se engajar intelectualmente nas áreas de filosofia, sociologia e política é fundamental para potencializar a construção argumentativa envolvida na formação ética, sobretudo na situação comum de nosso país em que muitos (talvez a maioria) apenas terão a possibilidade de ter acesso a essas temáticas pela via escolar. E para tal engajamento ser desfrutado, não convém ainda que a sala de aula seja apenas de “ensinagem”, no qual o professor diz e o aluno escuta e memoriza. Mas que se configure oferecendo e incentivando oportunidades de elaboração pelo estudante, por meio do livre pensamento, construindo reflexões criteriosas e discussões conjuntamente com o coletivo em que este está inserido.

Para além deste fator, faz-se preciso reconhecer que é pelo modo como a instituição escolar se organiza, pela forma como oferece acolhimento ou não às afetações de seus estudantes e pela maneira como ela gere seus conflitos internos é que a possibilidade de vivenciar a formação ética se efetiva. Sendo o psicólogo o profissional estratégico para atuar junto a estas questões e que por inúmeras vezes segue sendo negligenciado, já que muitas escolas ainda não compreenderam a importância de sua atuação.

Neste momento já estamos caminhando para o fim do ano letivo e os pensamentos já se encontram mais focados em férias do que na vivência escolar. Porém, se vale de indicação, para o ano que vem ou mesmo antes de iniciar as comemorações de fim de ano, reflita se não vale a pena questionar a escola com a qual você tem alguma relação sobre a presença de um profissional de psicologia como membro ativo da interação escolar e também sobre quais são as estratégias efetivas da instituição para favorecer a formação ética de seus estudantes. Confesso que eu não me surpreenderei se você não encontrar uma resposta satisfatória, porém cobrar e exigir das instituições escolares públicas e privadas o melhor que elas podem oferecer é nossa responsabilidade. E assumi-la é nossa parte neste compromisso ético.

Alayane Peixoto Pereira - Psicóloga

Psicóloga graduada pela Universidade Federal Fluminense, se engaja na temática da Educação desde 2012. Trabalha com atendimentos clínicos, principalmente direcionada ao público infanto-juvenil e realiza consultoria em instituições educacionais. Para mais informações: http://lattes.cnpq.br/5564050837006681

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